23 de ago. de 2017

Tomar gol também é belo

O esporte sempre permeou todo e qualquer momento que me vem à memória, desde o princípio da compreensão das coisas. Uma constante desde a primeira infância, vivenciei as disputas desportivas de forma assídua, o que persiste até data presente.

Das disputas, me propunha a pratica de toda e qualquer modalidade, mas com um viés claro evidenciado: o gol. Nas alterações hormonais da juventude, balançava entre posições. Ora gostava de fazer o gol, ora encontrava a beleza na defesa da baliza.

Contudo, a arte que encontramos em todas as partículas vivas até onde a visão alcança, não se baseou no jogo em si. O contexto é algo que cria e move o sentimento, caracterizado pelo conjunto de fatores que tratam de delinear uma atmosfera de prazer. Neste contexto, voltando à juventude, defini em determinado momento que gostaria de ser goleiro, lastimável.

Adepto da plasticidade, tinha em mente uma única finalidade para a minha não tão bem aventurada ida à meta: tomar gol bonito. Claro, ninguém entra em campo (ou quadra) para perder, mas comecei a encontrar beleza à solidão cruel do goleiro no momento de um belo gol, um gol de placa, afinal, sua arte se completa quando da desgraça do guarda metas, ou seja, o goleiro é complemento imprescindível de tal obra.

Passo, pois, a descrever minha ideia de um belo gol, no qual eu era parte fundamental buscando a bola no fundo das redes: a jogada se constrói desde o campo de defesa adversário, iniciando o ataque pelo goleiro, que solta a bola ao beque de fazenda, este, de simples (e bico), empurra a bola direto ao meia, o 10, que já na intermediária de ataque faz uma bela finta de corpo no marcador, o volante brucutu, e dispara com a canhota, chapando a bola com uma curva generosa, que encontra a rede lateral do retângulo, caindo suave após um deslize vulgar. Golaço!

Meu papel, enquanto última esperança de salvação, seria o de observar estático ao centro do gol, com um movimento calculado, onde somente o pescoço toma a ação com a missão de mover os olhos à admiração. A dúvida no grand finale do misancene ficava entre permanecer em pé ou criar um novo movimento, já após a efusiva comemoração do rival, onde dobro as pernas e caio para trás, apresentando aos demais o retrato da desolação. Escolhi ficar de pé, petrificada pela magnitude do momento que criei.


Claro, o resultado de tal empreitada não poderia ser outro se não a abreviação de uma carreira nada promissora. Abandonei a ideia ao primeiro ato, já que os demais não entenderam a arte suprimida, mas carrego esta polaroide grudada na cabeça, sem culpa de ter vivido a magia do gol. 

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